quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Uma partida de mau gosto

Quando ainda era jovem, deliciava-me com passeios de bicicleta. Gostava de explorar novos caminhos, apreciar a paisagem e os transeuntes que por lá andavam. A escolha rotineira de uma rota fixa ou a paragem no sítio do costume para tomar um refresco um comer um repasto não me trazia qualquer satisfação. Sentia-me extasiado quando penetrava no labirinto das ruas e estradas desconhecidas e emergia do outro lado, encontrando-me por vezes em caminho conhecido sem me dar conta. Indagava o que se passaria por trás das portas e janelas daquelas casas que nunca antes vira, das avenças e desavenças, atinos e desatinos, amores e desamores que constituiam as histórias dos seus habitantes. A ideia de que a convivência entre todos aqueles estranhos poderia ter uma riqueza dramática muito superior à que encontramos em qualquer romance. Era possível que moradores de localidades que calcorreava num dia tivessem uma relação, directa ou indirecta, com habitantes de outras localidades que visitava num outro dia, ou iriam estabelecê-la no futuro. Enquanto passava por uma dessas ruas desconhecidas, reparei numa localidade onde se erguiam dois edifícios de três andares que se percebia serem compostos por vários apartamentos. Percebiam-se três blocos por edifício separados por duas alas de escadas. Os prédios ladeavam uma pequena rua que desembocava num terréu. Questionei-me se algum dia iria conhecer alguém que ali morasse.
Há anos atrás, a escassez de componentes do grupo etnográfico da localidade onde habito colocava em risco a continuação da sua actividade. O problema fazia-se sentir com maior intensidade na constituição da orquestra. Foi-me endereçado o convite para ter aulas de concertina de modo a colmatar essa falha em particular. Anui. Com apenas quatro aulas desse instrumento já me consideraram apto para acompanhar os ensaios do grupo e, em termos didácticos, por aí me fiquei. Desenvolvendo a minha técnica de forma autodidática, ao fim de poucos anos, tornara-me um conhecido executante desse instrumento. A fama valeu-me uns convites para actuar em outros grupos etnográficos. Um desses grupos em particular, acabaria por construir a sua sede no final da rua que era ladeada pelos prédios de apartamentos. Ao estabelecer amizade com aqueles moradores, lembrei-me do dia que passara de bicicleta numa rua ali perto. Tratava-se de um bairro social.
Mesmo depois de abandonar as lides folclóricas, era frequente fazer pequenos espectáculos para os fregueses da sede, especialmente ao fim-de-semana. Após um desses espectáculos, fui abordado pelo Libório que se acabara de mudar para aquele bairro. Propôs-me a formação de uma banda musical orientada para a música popular. O Libório era experiente baterista e tinha conhecimentos de piano e guitarra eléctrica. Acedi ao pedido na condição de reduzir o número de ensaios com vocalistas com recurso a gravações. Abordámos o Osonório, um excelente vocalista com uma boa presença em palco. O Libório decidiu acrescentar um segundo vocalista, o Paracetamório, que, entre empregos temporários, tinha a necessidade de angariar alguns fundos extraordinários.
O Paracetamório era uma vítima frequente de partidas de mau gosto. Não porque não fosse estimado pelos amigos mas porque se predispunha a isso. Cheguei a ver o Libório a adulterar um pacote de açúcar com sais de frutos que, quando colocado sobre o café, faz com que este crie uma cascata, escorrendo pelas extremidades da chávena. É claro que o Paracetamório constituiu a primeira vítima. Esta partida foi subsequentemente estendida aos vários clientes assíduos da casa. Certo dia, o Libório imprimiu apenas uma face de uma nota de €50 que deixou à saída do bar da sede, observando a reacção de quem ali entrava. O Paracetamório, dada a sua experiência como vítima de partidas de mau gosto determinou automaticamente a falsidade da nota. Curiosamente, teria sido o Centrumório, irmão do Libório, a causar um ambiente mais eufórico. Quando se deparou com a nota no chão, calcou-a para escondê-la dos demais presentes. Quando pressentiu que ninguém reparava, colocou-a no bolso e usou-a num outro estabelecimento. A risada foi geral quando se mostrou indignado por ter tentado usar uma nota falsa na aquisição de bens. O Libório contara-me também que o Paracetamório, enquanto trabalhavam na mesma obra, costumava urinar no mesmo sítio e à mesma hora. A certa altura, alguém se lembrou de colocar uma placa metálica submetida a um potencial eléctrico levemente coberta com pó. É claro que a rotina do Paracetamório valeu-lhe, nesse dia, um forte formigueiro sobre o corpo e um penteado diferente.
Durante uns anos, aquele bar tornou-se o ponto de encontro de adolescentes de localidades ali perto. De entre eles, destacava-se a Ritalina pela sua capacidade para criar enredos dramáticos, tendo como personagem principal, a sua prima Actifina. A Ritalina criava intrigas e usava-se da sedução para causar prejuízo às relações amorosas da Actifina. Ao usar a sua capacidade sedutora sem escrúpulos, passou a ser conhecida pela sua leviandade, apesar de ser menor de idade. Confesso que o seu comportamento me causava uma certa antipatia devido ao efeito dos enredos que criava tinha naquele nosso grupo de jovens.
Um dia, a Ritalina abeirou-se de mim e disse-me:
- Olha! Tu diz ao teu amigo que me anda a assediar por telefone e eu sou menor de idade!
- Que amigo? - Perguntei-lhe.
- Aquele que canta na tua banda, o Paracetamório.
- Que tenho eu a ver com isso? - Returqui-lhe em modo de pergunta. - Mas deixa estar que eu falo com ele.
O Paracetamório encontrava-se a trabalhar na construção em Lisboa e não era nada frequente telefonar-me. Coincidiu contactar-me nesse preciso momento.
- O Paracetamório está a tentar ligar-me. Vou tratar do assunto. - Disse eu à Ritalina.
Atendi a chamada telefónica e, antes que ele falasse, disse-lhe:
- A polícia esteve a falar comigo a perguntar se te conhecia. Eu disse-lhes que, apesar de te conhecer por seres vocalista da nossa banda, não lhes poderia facultar informação adicional.
- O que andaste a fazer? - Acrescentei.
- Deve ter sido por ter mandado uma mensagem à Ritalina. - Returquiu.
- Fala com o Libório, pois parece que a polícia ainda não o interpelou.
- Vou falar com ele. - Finalizou o Paracetamório, desligando o telefone.
Pensei que o Libório libório dissipasse esta pequena partida. Porém, de forma novamente coincidente, aprochega-se o Libório.
- Olha, o Paracetamório vai-te ligar. Disse-lhe que a polícia tinha falado comigo mas não lhe tinha facultado grande informação. Parece que andou a mandar mensagens impróprias à Ritalina.
Entretanto ouve-se o telemóvel do Libório. Tratava-se da esperada chamada do Paracetamório. Antes que ele começasse a falar, começa o Libório:
- A polícia anda a tentar saber onde moras. Não fui o único a ser interpelado.
Despedi-me do Libório enquanto ele falava com o Paracetamório, na esperança de que não prolongasse muito a pequena partida.
No dia seguinte, recebi um telefonema do Libório:
- A história é para ser mantida, o Paracetamório não pode saber a verdade.
Contou-me então que convencera muita gente a ligar-lhe a perguntar o que se passava porque a polícia andava a investigá-lo. Alguém tivera-lhe dito que o pai da Ritalina também andava à sua procura com o intuito de o punir fisicamente.
O Paracetamório, não conseguindo descansar, pedui ao patrão que o trouxesse de volta pois tinha de resolver o problema. Fizeram cerca de trezentos quilómetros durante a madrugada. Quando o Paracetamório chegou a casa telefonou ao Libório:
- Estou em casa e vou agora ao tribunal.
- Espera por mim antes de ires, preciso falar contigo.
A preocupação do Libório era notória. O caso tinha descambado demais. Apesar da convicção do Paracetamório, o Libório convenceu-o a esquecer o tribunal, alegando que ele próprio iria resolver o problema. O Paracetamório acedeu mas a mentira continuo a ser a sua verdade. O susto foi grande. Uma queixa em tribunal oriunda de uma intriga insignificante iria trazer problemas aos intervenientes.
O Paracetamório foi alvo de piadas sobre pedofilia a partir daquele episódio. Consta-se que enjoou o arroz de miúdos.

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Uma paixão por correspondência

Apesar de não se identificarem com as actividades de divulgação etnográfica, o Libório e o Osonório serviam o rancho folclório da sua localidade como instrumentistas. De facto, dada a sua famigerada mestria na execução de melodias e acordes na concertina, inseriam grupos de índole etnográfica nas freguesias vizinhas.
Os componentes de um rancho folclórico distinguem-se em dois grupos, o daqueles para os quais a actividade é parte integrante dos seus propósitos de realização de vida e o daqueles que, na ausência de meios de entretenimento alternativos, seguem esses trâmites quando se encontram entregues à sua ociosidade. O Libório e o Osonório não se classificavam em qualquer desses grupos. Encontrando-se o rancho da localidade em tempos conturbados devido à escassez de instrumentistas, o Libório fora convidado a frequentar aulas privadas de concertina de modo a colmatar essa lacuna. Ao fim de quatro lições encontrara-se apto a dar suporte ao acordeonista principal. Depois de se amestrar em tal arte, o Libório recrutou o Osonório como um dos seus pupilos e ambos davam suporte às mostras etnográficas levadas a cabo pelo grupo. Não frequentavam o grupo como objecto de entretenimento nem tampouco isso contribuída para a sua realização pessoal. A sua permanência era justificada por uma espécie de compromisso de responsabilidade, dado que a sua exoneração, apesar de não ser suficiente para lhe por termo, era o bastante para causar transtorno. A carência de motivação e a dedicação a projectos mais talhados às suas expectativas levou o Libório a abandonar o folclore. O Osonório, por seu turno, lá permaneceria enquanto não se alterasse a sua situação pessoal.
Durante o tempo que dedicou à etnografia, o Libório travou amizades e estabeleceu contactos que, apesar das suas características não se enquadrarem nas sua áreas de eleição, trouxeram sempre algo de positivo à sua relação social. No entanto, não tanto da sua responsabilidade, cultivou algumas inimizades que lhe traziam alguns dissabores. O cerne das suas conflituosidades consistia numa indivídua que, se assim se possa chamar, poderia ser considerar como sendo a sua anti-namorada. Talvez se devesse a alguma psicose ou repulsa sexual, o seu comportamento abjecto quando se tratava de manter qualquer espécie de relação interpessoal despida de qualquer intuito amoroso com o Libório, ou quiçá pudesse imaginá-lo como alguém que poderia eventualmente interpor entre si e o seu idealizado amante. É certo que tal atitude levou ao surgimento de atritos, aos quais o Libório deixou de ser indiferente, cultivando, deste modo, uma considerável aversão  àquela pessoa.
O Osonório continuou a actividade após a exoneração do Libório, substituindo-o como instrumentista principal. O abandono do Libório havia sido planeada muito antes, tendo sido o seu empenho na formação do Osonório motivado por esse desejo, sem prejuízo para a continuidade do grupo. Ambos reuniam-se regularmente para confratenização social durante um café ou à mesa de um bar. Numa das suas conversas casuais, começou a materializar-se uma ideia algo bizarra.
Enquanto o Libório prosseguia os seus estudos de mestrado, o Osonório arranjara emprego na indústria metalomecânica como técnico de testes de tratamentos térmicos. As características predominantemente masculinas da sua equipa dava azo à troca entre membros dos contactos telefónicos das raparigas mais bonitas. Tal comportamento era quase como um ritual frequentemente estendido aos amigos mais chegados com o propósito de aprofundar a rede de informação. No cerne do sistema estava o Paracetamório cujos atributos físicos lhe permitiam extrair confidências das mais prudentes mulheres.
A mesma usina empregava o Patetório, um indivíduo que se caracterizava pela sua deficiência intelectual. O Patetório era mais alto do que o Libório e o Osonório, tinha um corpo esguio, malfeito e um defeito no nariz tornavam-no numa figura pouco atraente. O seu cabelo escuro ondulado, apesar de cortado curto, deixava antever esporádicos caracóis. A mesma idumentária que albergava todos os dias assinalava a sua falta de esmero e sua pronunciada dislalia exacerbavam a sua rejeição por parte dos indivíduos do sexo oposto. As suas feições e defeitos congénitos remetiam-no para os mais baixos patamares sociais, tornando-o alvo de partidas humilhantes, motejos de mau gosto e críticas insultuosas.
O Libório conhecera-o nessas circunstâncias. Alguém proferira um piropo depriciativo e o Palermório tornou-se agressivo com todos os presentes. A sua atitude tornou aquela cena indelével na memória do Libório.
- O Patetório insiste que lhe forneça alguns dos meus contactos. 
Queixava-se o Osonório enquanto tragava um gole de café.
- Estou a pensar em facultar-lhe o contacto de duas feias que considero insuportáveis.
Continuou.
- A que Patetório te referes?
Perguntou o Libório curioso. Uma breve descrição física e a referência ao seu distúrbio da fala foram suficientes ao Libório para identificar o indivíduo em causa.
- Conheci-o há um tempo atrás. Que pessoa caricata!
- Respondeu o Libório e continuou:
- Porque não lhe forneces o meu número de telfone e dizes tratar-se de uma rapariga muito bonita?
O Osonório sentia-se desconfortável com acções irreverentes e, por isso, começou por considerar a ideia como algo a refutar.
- Não me parece que seja boa ideia.
- Porquê? - Perguntou o Libório. Continuou:
- Poderias encarar isso como uma partida inofensiva.
Após um prolongado debate, o Libório convenceu o Osonório a alinhar no seu inofensivo plano.
Não tardou muito até que o Patetório voltasse a insistir na partilha de contactos.
- Vou-te providenciar o contacto de uma rapariga que talvez te possa interessar.
- Obrigado, Osonório. Vou tentar a minha sorte o quanto antes. - Diz-lhe o Palermório.
O Osonório, de acordo com o combinado, forneceu-lhe o contacto do Libório. De seguida, avisou o Libório, enviando-lhe a mensagem:
- "Cedi o teu número de telefone ao Palermório como combinado. Ele pensa que és uma rapariga."
Na mesma mensagem, o Osonório enviou o número de Palermório de modo que o Libório pudesse identificar qualquer as suas mensagens ou telefonemas.
O Palermório não tardou a enviar a primeira mensagem.
-"Quem és"? - Escreveu.
O Libório, dando a entender tratar-se de uma pessoa que não se entrega a confidências com desconhecidos, returque com uma pergunta:
-"Isso pergunto eu! Quem és tu?"
A resposta não se fez demorar.
-"Sou o Palermório."
-"Como conseguiste o meu número?"- escreveu o Libório com o intuito de despistar quaisquer dúvidas cuja facilidade de aceitação pudesse indicar algo de errado.
A resposta do Palermório, apesar de demorada, parecia conter uma justificação razoável para além de proteger a confidencialidade da fonte. Como a generalidade das raparigas adolescentes têm predisposição para travar novas amizades com rapazes das suas idades ou um pouco mais velhos, o Libório decidiu facilitar o início de uma espécie de amizade virtual por correspondência sem que esse comportamento parecesse estranho ao Palermório.
O Palermório começou pelas mensagens de piadas e escalou o tema até ao nível da sedução com troca de mensagens apaixonadas. Procurou saber alguns detalhes da suposta rapariga e acabou por lhe sugerir o envio de uma fotografia. Trocaram fotografias, tendo o Libório personificado a rapariga do grupo etnográfico que lhe causava repulsa. Para além do facto de que frequentava um grupo folclórico, o Libório contou ao Palermório algumas supostas confidências não obstante a sua iversossimilidade. O ponto alto da realização do Palermório aconteceu quando a suporta rapariga se mostrou disponível para um encontro em pessoa.
- "Na próxima sexta-feira tenho ensaio do rancho."
- "Podes ir lá ter comigo."
Escreveu o Libório, personificando a rapariga.
- "Está bem." - Escreveu o Palermório.
O cenário da partida estava montado. No entanto, para atingir o máximo efeito, era necessária a intervenção do Osonório.
- Marquei um encontro com o Palermório no ensaio do rancho. - Disse o Libório.
- Mas a rapariga em questão vai lá estar. - Responde o Osonório.
- É essa a ideia.
E continuou o Libório:
- Quando ele chegar, preciso que me descrevas todo o cenário, onde ambos se encontram e como se estão a comportar.
- Como queres que faça isso? - Perguntou o Osonório.
- Através de mensagens. Depois vou lá ter.
- Mas eles podem desconfiar. - O Osonório mostrava-se reticente, temendo ser descoberto.
Após alguns momentos de insistência, o Libório convenceu o Osonório a alinhar no seu plano.
A existência de um bar nas sedes das imensas colectividades que polulam pelo país é um condimento essencial tanto na angariação de alguma receita como na serventia dos sócios. A sede do rancho situava-se num edifício antigo. O salão onde se realizavam os ensaios ocupava a totalidade do rés-do-chão. O bar era aberto ao público no primeiro andar, dividindo o espaço com um pequeno armazém para roupas e utensílios e uma sala de reuniões da direcção.
A rapariga foi a primeira a chegar ao ensaio do rancho, levando o Osonório a informar o Libório de que tinha subido ao primeiro andar.
- Já chegue! A que horas vens? - continha a mensagem de telemóvel que o Libório enviara ao Palermório, fazendo-se passar por outra pessoa.
- Estou ansiosa por te conhecer. - Continuou.
Quando o Palermório chegou ao local, a rapariga já se encontrava no salão de ensaios, facto que era conhecido do Libório através do Osonório.
- Sobe ao primeiro andar e espera po mim no bar que eu já lá vou ter. Estou aqui a discutir assuntos importantes com umas pessoas. - Escreveu o Libório.
O Osonório informou o Libório que o Palermório chegara ao bar e o cumprimentara, negando-se a continuar a compactuação com a brincadeira. Receava, claro, ser desmascarado pelo seu colega de trabalho. O Libório, face à ausência de informação foi forçado a deslocar-se ao local. Não decorreu muito tempo até que se iniciasse o ensaio.
- Desculpa-me a demora, o ensaio já começou. Anda ter ao salão que depois falo contigo. - Mensagem recebida pelo Palermório.
Quando o Libório chegou, já decorria o ensaio. Entre a assitência encontrava-se o Palermório com um semblante pesado que parecia transparecer um misto de tristeza e espanto.
- O que está ele aqui a fazer? - Perguntavam os elementos do rancho entre si, com o intuito de atormentar o Palermório. Era grande a sua fama.
- O que te traz por cá? - Perguntou um elemento mais condescendente e que o conhecia.
O Palermório não ousou responder. O seu estado de espírito não lho permitia.
No final do ensaio, o Palermório arranjou coragem para enterpelar a rapariga.
- Porque não vieste ter comigo? - Perguntou o Palermório.
- Porque fazê-lo, se não te conheço? - Resturquiu a rapariga com uma nova pergunta.
- Mas disseste que me amavas e que me querias conhecer! - Insiste o Palermório.
- Conheces esse indivíduo? - Perguntou uma componente do rancho, mostrando uma arrogância desmedida e impedindo o Palermório de obter uma resposta.
No final, restavam apenas o Libório, o Osonório, e o Palermório, com os seus olhos lacrimejantes, convidara-os para acompanhá-lo a uma festa popular organizada num freguesia vizinha. Durante a viagem contava a sua história, tendo o Osonório como principal receptor:
«
Quando te convenci a facultar-me o número dela, Osonório, enviei-lhe uma mensagem para o telemóvel com o desejo de conhecê-la. Ao princípio pareceu não interessar-se mas com o tempo acabou por mudar de opinião. Começámos a ter conversas mais agradáveis e acabámos por trocar fotografias. Ela achou-me lindo e, mais tarde, disse que me amava. Dizia-o todos os dias. Eu também a amava e trocávamos mensagens de ternura.
Decidi dar um passo em frente e convidá-la para um encontro pois desejava conhecê-la pessoalmente. Ela dizia que era difícil porque trabalhava e, ao fim-de-semana, era ocupada pela família. Lembrou-se de marcar o encontro durante o ensaio do rancho.
Disse-me para encontrá-la no bar da colectividade. Quando lá cheguei, ela estava na salão a conversar descontraidamente com outras pessoas, dizendo-me tratar-se da discussão de assuntos importantes. Quando o ensaio começou, pediu-me para descer e interpelá-la quando quisesse. Fi-lo no final do ensaio, como viste. Não percebi o que aconteceu. Disse-me que não me conhecia depois de ter enviado todas aquelas mensagens de amor. Não consigo compreender a sua atitude. Num momento diz que me ama e, no momento seguinte, diz que não me conhece.
»
Durante o discurso, o Osonório mostrava um misto de complacência e apreensão. Conhecia bem a históra. O Libório fazia um grande esforço para conter as gargalhadas, mostrando um semblante apático sempre que o Palermório o encarava pelo espelho rectrovisor.
Muitas paixões por correspondência resultaram. Esta não. Não estava destinada à partida.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Vai lá cheirar

Era uma daquelas noites de Outono, quando este adivinhava um Inverno rigoroso. O frio já se fazia sentir, apesar do ligeiro aquecimento devido à grande nebolusidade do céu. Uma amiga do Osonório comemorava o seu aniversário num botequo algures no meio de um lugarejo isolado de qualquer grande cidade.
O pequeno restaurante, apesar de carecer daquela elegância mínima que é habitualmente requerida por quem se entrega aos prazeres gastronómicos, proporcionava agradáveis refeições cozinhadas, na hora, ao braseiro. Além disso, contava-se com a cordialidade e o ambiente familiar que lá se fazia sentir sendo, talvez, esse o principal motivo que levava os amigos do Osonório a optarem por aquele estabelecimento.
O Osonório repetiu o repasto algumas vezes, acompanhando com um vinho tinto suave mas com um considerável grau de álcool. Comeu e bebeu até ficar enfastiado, rematando, no final, com os usuais digestivos. A festa ainda estava por começar e já se encontravam quase todos num elevado estado de ebriez, cantando e dançando como se o chão se abalasse ao sabor de uma força misteriosa.
A saída do boteco, quando noite já ia alta, fez-se acompanhar pelo som acutilante e o cheiro a borracha queimada dos pneus a derraparem violentamente no asfalto. Talvez fosse o estado de embriaguez, talvez fosse o resultado duma estranha euforia. Foi, decerto, o despertar daquela irreverência característica da juventude, aquela necessidade de se fazerem ouvir e marcarem presença. O seu destino foi um movimentado bar da cidade mais próxima, do qual eram já clientes habituais.
Quando o Osonório chegou, já lá se encontrava, à espera, o seu amigo inseparável Libório. Apesar de ser uma amiga em comum, o Libório sentiu-se na obrigação de declinar o convite para o aniversário sob a alçada dum sincero pretexto relacionado com problemas financeiros.
O seu grupo de amigos era socialmente heterogénio. O Libório e o Osonório sempre foram indivíduos despreconceituosos e aceitavam, para amizade, certa gente que se entregava, casualmente, ao consumo de estupefacientes. Muitas vezes, as companhias ditam a forma como uma sociedade essencialmente preconceituosa encara as pessoas. É claro que alguém cujas amizades incluam personagens com certos vícios não será, necessariamente, um viciado, apesar de correr o risco de lhe serem imputadas tais contornos.
A música do bar convidava ao balanço impulsivo do corpo e a sede mandava vir, regularmente, aquele tipo de bebidas que dão um certo grau de êxase a quem as consome exageradamente. O Osonório, que já tinha exagerado a dose no jantar, misturava, ao sabor do balanço, aquelas que ia tragando durante a faina nocturna. O resultado, para além da ebriedade, consistiu naquilo a que vulgarmente chamamos de “descarga da visícula” causada pelo trabalho excessivo pespegado ao fígado. A maleita manifestou-se como uma pontada na barriga, queixando-se o Osonório:

- Ó Libório, estou com uma vontade insuportável de mandar uma valente cagada.

O Libório acompanhou-o até à porta da casa-de-banho, enquanto saboreava um refrigerante, uma vez que, devido à sua condição de saúde, se encontrava medicado com psicotrópicos.

- O que é que ele está aí dentro a fazer? – Perguntou um indivíduo corpulento, deixando antever traços de fúria, apesar de não intimidar o Libório.

Os seus amigos cujos comportamentos eram mais ilícitos tinham, por hábito, recorrer à sala da latrina para fumar um “piquinha”. O indivíduo que acabara de interpelar o Libório parecia convicto de que o Osonório padecia das mesmas necessidades ou tinha os mesmos hábitos que os seus amigos. O Libório desconfiou da natureza da pergunta, à qual responde:

- Está a cagar!

O indivíduo não fazia parte do pessoal da casa, estando apenas a alardear-se como um herói de banda desenhada, querendo impôr uma ideia de ser o gendarme da retrete. Coninua com a mesma intensidade de voz:

- Eu sei o que ele ali está a fazer. Está a fumar droga.

- Não está nada... está a cagar. – Returque o Libório.

O Osonório, que ouvira o alvoroço, levantou-se num rompante, sem limpar convenientemente o cú ou sequer puxar o autoclismo, içou as calças com toda a pressa e abriu violentamente a porta, gritando:

- Se achas que estive a fumar, vai lá cheirar.

Ambos continuaram o seu entretenimento. O sujeito entrou no cubículo no qual a merda pastosa estava colada às paredes da cloaca, deitando um cheiro tão fétido que drogava qualquer um. Começou como um herói de banda desenhada e acabou como um “cheira merda”.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Azedumes de ignorante

Decorria mais uma aula de Linguagens de Programação na ULP (Universidade Lusófona do Porto). O professor, baixo com um carácter altivo, impunha a elaboração de um programa em JAVA que permitisse ao utilizador gerir as actividades do dia-a-dia. O modo como a aplicação armazenasse a informação ficava ao critério do aluno. No entanto, o professor sugeria a elaboração de um sistema de ficheiros vulgar.
O André, que era aluno assíduo da disciplina de Bases de Dados logo se propôs a utilizar os conceitos que ia adquirindo na área, afins ao desenvolvimento em motores de bases de dados ORACLE. A sua preferência pelas versões mais recentes levou-o a considerar a última versão no mercado desta tecnologia, nomeadamente, a ORACLE 11g.
No dia da apresentação dos projectos, a grande maioria dos alunos previa a aplicação dum sistema de ficheiros. Contudo, o André estava empenhado em lograr com o recurso a um sistema amplamente desenvolvido e testado que se prestasse aos mesmos fins. Depois de submeter a sua ideia à avaliação do professor, este pergunta-lhe com visível arrogância:
- Então, está a pensar em utilizar o motor ORACLE 11g. Acha mesmo que consegue?
O André returque prontamente:
- Claro que sim, professor.
O professor, esboçando um riso sarcástico, responde:
- Fico à espera que isso aconteça.
O rapaz estava confiante que conseguiria levar a sua ideia a bom porto. Em pouco tempo contornou todos os problemas inerentes à instalação das tecnologias necessárias e passou ao desenvolvimento da aplicação requerida, após elaborar a interface de interacção do seu programa com o utilizador.
Além dos requisitos requeridos pelo avaliador, o André teceu alguns melhoramentos que considerou pertinentes no seguimento do trabalho que se propôs desenvolver. Qualquer hipótese que pudesse ser alvitrada aferente à possibilidade da obtenção do código de um programa do género na Internet seria descartada à partida, uma vez que não é pertienente, de modo algum, desenvolver uma aplicação com características tão simples utilizando um recurso tão extenso e elaborado como a tecnologia 11g. O André considerava esta hipótese como sendo intuitiva e irrefutável.
Chegada a hora da apresentação do seu trabalho, o André logo começa a preparar o aparato necessário para atingir o seu fim. Liga o seu MAC onde tinha instalado, numa segunda partição, a versão mais recente do Windows Server, sistema operativo de servidor onde conseguira instalar o respectivo recurso de base de dados.
- Então? – Pergunta, impacientemente, o professor, demonstrando novamente um trejeito de arrogância – Porque é que isso ainda não está a funcionar?
Responde o André, com a sua habitual boa disposição:
- Calma, professor, isto leva o seu tempo.
O sorriso sarcástico abandona a fronte do professor no instante que este vê o programa a funcionar em pleno. O André tinha conseguido aquilo a que se tinha proposto. Na esperança de encontrar alguma falha, acrescenta:
- Ainda não vi nada a funcionar!
O André demonstra o funcionamento do seu programa, expondo as ferramentas utilizadas para apreciação do professor e dos demais espectadores. A hipótese de que o programa se ligava a uma tecnologia tão elaborada depressa se tornou um facto. Quando o André se preparava para expor os passos que seriam necessários tomar para configurar a ORACLE 11g, o professor remata:
- Não quero saber disso para nada! Só me interessa o código.
Nesse instante acabara de mostrar a sua altivez e arrogância, característica de uma pessoa verdadeiramente bruta e estúpida. Exige analisar o teor do trabalho, na sua essência. Duas características, para além do sistema de bases de dados, eram passíveis de ênfase. A primeira, consistia no modo como se codificava, em JAVA, uma ligação à base de dados. A outra, mais orientada para a apresentação, baseava-se em SWING, livraria vocacionada para a criação de interfaces de utilização visuais. O André logo se propõe a expor a sua linha de raciocínio nestas áreas. Quando se preparava para fazê-lo, é novamente interrompido pelo alarve professor que, de imediato, começa a rebuscar o código com o perverso intuito de desacreditar o autor do trabalho.
- Diga-me lá! – assevera ele – Para que serve aqui a função finalize?
Returque-lhe, o André de uma forma assertiva:
Esta função é chamada sempre que um objecto é destruído. Utilizei-a para garantir o encerramento da conexão quando o objecto que a gere deixa de ser referenciado.
O professor, insatisfeito, garante-lhe que não se tratava de uma resposta válida e insiste no tema durante um tempo, referindo o facto de que o autor não controlava o tempo em que tal função seria chamada no programa. De facto, o objectivo era garantir o encerramento de uma conexão, caso se tivesse esquecido de fazê-lo manualmente. O instante em que a conexão é encerrada adquire, neste contexto, um carácter de irrelevância.
Com um estado de espírito cada vez mais pesado, o avaliador rebusca o código novamente. Finalmente encontrara o calcanhar de Aquiles do André, centrando-se num pormenor tão irrisório que o remete para o estatuto de ignorante incapaz de ensinar numa disciplina da área. Pergunta-lhe para que serve o carácter @ numa linha onde se lia

@SuppressWarnings

Ora, esta declaração consiste precisamente numa anotação (metainformação associada a um elemento de JAVA) cujo propósito é ser utilizado por determinadas ferramentas como o compilador ou o javadoc. O André conhecia o efeito mas não estava ciente do princípio. Responde-lhe então:
- Isso não sei, professor. Contudo, se remover essa linha, o meu código continua a funcionar apesar do compilador debitar um ror de avisos.
Apesar da resposta prática do André, o professor insiste no significado do @ na linha correspondente. Depois de insistir num pormenor tão insignificante, conclui erroneamente:
- Atribuo-te a nota zero no trabalho. Este, foi realizado por um profissional muito melhor do que eu. Foi esse mesmo profissional quem te configurou o motor de base de dados.
Evidentemente, o André não se conforma com a avaliação e remete o caso para a provedoria. O seu programa fica conhecido no meio docente e o professor, com um comentário tão ignóbil, deixa de ter autoridade moral para ser docente, na medida em que foi ele o verdadeiro autor de tal programa.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

O Osonório e o Libório em "Engendrar uma caganeira"

O sol raiava intensamente numa tarde de calor. O verão ia a meio e proporcionava ao Osonório e ao Libório mais um dia enfadonho. Era um daqueles sábados em que não lhes surgia alguma ideia para passar o tempo. Estavam sentados no sofá da sala a ver um programa na televisão que não lhes despertava qualquer interesse. Pensar numa actividade no exterior da casa estava fora de questão. As pedras da estrada ferviam e a própria sombra das árvores era quente. Não apetecia mover um único músculo do corpo.
- Vamos jogar às cartas?
Pergunta o Osonório, demonstrando uma vontade de se distrair. Contudo, o Libório não se mostrava disposto a enveredar por esse género de actividades lúdicas. Tinham almoçado, não fazia muito tempo e o ambiente convidava àquilo que ambos não pretendiam – dormir. O irmão do Osonório enveredara por essa saída. A mãe, por seu turno, entregava-se às lides domésticas duma dona de casa. Acabara de lavar a loiça e começava as habituais arrumações do fim-de-semana.
O Libório, como tinha almoçado em casa do Osonório, não tinha tomado o medicamento prescrito pelo médico de família. Tinha problemas de anemia, o qual era tratado com o recurso a um fármaco rico em ferro, essencial para a produção de hemoglobina no sangue. Algures no meio da conversa arrastada que levavam, o Libório comenta:
- Hoje, como comi aqui, não tomei o meu xarope!
Como a anemia do Libório não constituía um caso sério, o Osonório desconhecia por completo o seu estado de saúde. Pergunta-lhe admirado:
- Estás a tomar xarope para quê?
- Estou a tomar ferro para o sangue. – Responde-lhe prontamente. – Tenho problemas de anemia e preciso de repor o ferro em falta.
O Libório estava seguro de que se abster de tomar o remédio num dia apenas não iria ter grande influência no seu tratamento. Apenas dissera-o para quebrar o ambiente silencioso que se abatia sobre eles.
- A minha mãe também anda a tomar um remédio para os ossos. – Confessa o Osonório.
- Ela toma dois tipos de remédio para isso. Se ela abusar num deles corre o risco de apanhar uma caganeira.
O Libório mostrava-se perplexo e ao mesmo tempo incrédulo. Afinal, como poderia um remédio para os ossos, causar uma caganeira? Num instante se gera um debate aceso sobre a veracidade da asserção do Osonório. Este decide então mostrar as embalagens onde se encontravam os remédios. Eram duas caixas diferentes ainda com comprimidos lá dentro.
- São estes comprimidos que causam caganeira!
Afirmava o Osonório levantando a caixa que tinha uma lista roxa. O Libório continuava a interrogar-se por que motivo a mãe dele tomava dois tipos de fármacos para os ossos onde um deles causava diarreia. No meio da algazarra, surge uma ideia na mente do Osonório:
- E se esmigalhássemos um destes comprimidos na água de beber aqui de casa?
Ambos concluíram que, caso dissolvessem um daqueles comprimidos na água, toda a gente que a bebesse apanharia uma caganeira. Estava no ar o mote para uma tarde bem passada. Puseram mãos à obra e congeminaram um plano para causar uma diarreia à família do Osonório.
Tiraram, à socapa, a água de beber do frigorífico e esconderam-se no quarto com as embalagens dos remédios. O Osonório tira um dos comprimidos que provocavam a evacuação intestinal e começa a migá-lo num cinzeiro com um pouco de água.
O Osonório tinha o desagradável hábito de provar tudo o que encontrava, desde granulado para as vacas até às pétalas de rosas. Movido por essa sua estranha tendência, decide provar a pasta que acabara de fazer.
- É bom! Queres provar?
O Libório considerava que não era seguro experimentar a mistela, já que sabia qual era a sua origem e nega-se a fazê-lo. Pelo contrário, o seu amigo, à medida que ia moendo os comprimidos, ia provando a pasta. Quando consideraram que já tinham produzido uma quantidade de pasta suficiente, o Osonório coloca uma pequena parte na água da garrafa e decide mexer com um lápis para conseguir uma mistura homogénea de modo a passar despercebida. Devido à sua inaptidão manual, deixa cair o lápis no recipiente.
- Olha… Deixei cair o lápis aqui dentro.
Diz para o Libório que o observava com atenção.
- Temos de o tirar. Não podemos recolocar a garrafa com o lápis aí dentro.
Responde o Libório de imediato. O Osonório começa por inclinar ligeiramente a garrafa com o intuito de apanhar o lápis. Por azar, durante todo o processo, esvazia a garrafa por completo. O Libório começa-se a rir.
- A garrafa está vazia. Já não é possível realizarmos a empreitada.
O Osonório discordava. Era suficiente encher a garrafa numa torneira. A única possibilidade que lhe ocorria consistia em distrair a mãe para enchê-la na torneira da cozinha. Era uma tarefa deveras complicada e fora do alcance das capacidades de ambos. Em poucos segundos surge uma ideia na mente do Libório que viria a salvar a situação.
O quarto onde faziam as suas experiências tinha uma mesa encostada sob o parapeito de uma janela que dava para um pátio. Decidem sair pela janela com a garrafa e vão enchê-la com a água da mangueira usada regularmente para lavar o chão e regar o jardim. Essa água era imprópria para consumo mas desempenhava o papel que pretendiam. O Libório já começava a achar aquela cena deveras hilariante e ria-se efusivamente.
Voltam para o quarto com a garrafa completamente cheia de água da mangueira e preparam a mistura evacuativa. Com toda a manha que lhes era característica, não lhes foi difícil repô-la no mesmo sítio do frigorífico donde a tinham tirado.
O Libório, novamente no quarto, não suportava o riso. Aliás, considerava que aquele episódio estava um pouco deslocado daquilo que considerava normal. O Osonório ria-se também, uma vez que a partida tinha grandes hipóteses de ser bem sucedida. No meio da euforia, o Osonório solta um peido com uma sonoridade exagerada. Fizeram silêncio.
- Caguei-me!
Diz o Osonório que tinha provado a mistela.
- Isso, eu sei! – Responde o Libório. – Ouviu-se bem.
- Não! Caguei nas …
Antes que conseguisse completar a frase ouviram “próóóóóó” com uma intensidade ainda maior do que a anterior.
- Caguei-me outra vez.
O Libório começava a ter dificuldade em suportar o riso. O Osonório, por seu turno, estava numa situação desagradável. Só lhe apetecia rir com toda aquela situação e o cenário hilariante atiçava-lhe a vontade de fazer merda. Ao ouvir aquele alarido, o irmão do Osonório que tinha acordado da sesta há pouco tempo, entra no quarto e encontra os dois amigos demasiado ridentes. Pergunta:
- Estais-vos a rir de quê?
Como os dois não respondem no meio de tanto riso, conclui:
- Já prepararam alguma e não querem dizer.
- Estamos a rir-nos duma anedota. – Returque o Libório, enquanto o companheiro manda grandes e sonoras cagadas. O irmão do Osonório, pouco convencido, abandona o quarto ao som dos peidos e das risadas.
O Osonório passou muito tempo na casa de banho a cagar. Teve de tomar banho e vestir roupa lavada. Toda a gente da família do Osonório andou de caganeira durante aproximadamente uma semana. Pelo menos, andaram assim enquanto durou a água da mangueira na garrafa. A irmã do Osonório reparara que este preferia beber água da torneira. Achava aquele comportamento estranho mas nunca desconfiou que a caganeira que a maçava estava associada à água nem tampouco ao bizarro comportamento do irmão.
Os dois amigos mais tarde vieram a saber que, aquilo que pensavam ser comprimidos para os ossos, não passava de um fármaco para a prisão de ventre.

terça-feira, 30 de março de 2010

O manual (Uma desilusão numa prenda de amor)


O manual elaborado pelo Jorge e pelo Francisco pode ser encontrado aqui.

quinta-feira, 25 de março de 2010

A mensagem endereçada ao Rui (Uma desilusão numa prenda de amor)




Para o Rui,
Engenharia Informática

Meu querido amor,



Desde o primeiro dia que te vi, o meu coração não mais conheceu outra paixão. Sempre que passas por mim, o teu sorriso tão belo incendeia-me por dentro. Sinto-me hipnotizada apenas de tentar olhar-te nos olhos e o sangue gela-me nas veias sempre que estou perto de ti.




Este amor que me atormenta cresce desde aquele dia de sol quando te vi entrar na faculdade. Desde então, empenhei-me a arranjar coragem para te interpelar, trocar uma palavra contigo, uma sequer. Mas sou demasiado tímida e elas faltam-me. Espero que, com este humilde presente, finalmente ganhe a coragem que me falta para poder entrar na tua vida, se o permitires.




És aquilo que sempre sonhei, o meu príncipe encantado, a minha razão de viver. Deixo-te esta prenda de afecto na esperança que te atinja o coração da forma que o desejo e que contribua um pouco para a tua felicidade.




Desta sempre tua amada que espera ansiosamente declarar-se.